sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Mentiras transparentes. Rousseau e a Contra-revolução romântica

I Colóquio Rousseau. “Rousseau, verdades e mentiras”

Faculdade de Ciências e Letras - UNESP – Araraquara
12 a 14 de novembro de 2003


Mentiras transparentes. Rousseau e a Contra-revolução romântica

Conferência de Abertura
Prof. Dr. Roberto Romano (UNICAMP)


No simpósio que hoje se inicia os senhores analisarão a mentira no pensamento do filósofo. Muitas facetas de suas fórmulas podem ser discutidas em detalhe, outras apenas de modo rápido. Desde os primeiros passos da filosofia, sabemos o quanto o engano deliberado, permitido aos dirigentes, integra em plano menor um saber que se volta para a verdade. Gostaria de usar, como inspiração de minha fala, algumas linhas de um comentador de Rousseau, que expõe o problema a ser levantado com maior freqüência nas atividades deste simpósio. Ao referir-se ao nexo entre filosofia e teatro no âmbito da ética, Guy Besse adianta: quer deseje ou não, saiba ou não, a filosofia para Rousseau é “comédia na comédia, ela enxerta a ilusão na ilusão. Se no Sobrinho de Rameau o filósofo imagina não entrar na pantomima, o autor do Primeiro Discurso e do prefácio do Narciso, não o poupa. O filósofo, também ele, se inclina. É preciso, portanto (…) observar que o jogo da aparência em Rousseau possui uma complicação, um refinamento extremos. Estaríamos errados se acreditássemos que para ele a aparência é apenas e nada mais do que mentira, máscara, violência mascarada. A aparência é máscara; é confissão. Ela esconde o que esconde e o sugere; digamos que ela o designa”.(Besse, 1974, p. 75).

Deixemos de lado, na passagem de Guy Besse, a leitura superficial do Sobrinho de Rameau, visto que ela paga tributo à uma divisão prestigiosa mas pouco fundamentada entre o filósofo e o vagabundo genial e observemos os enunciados. As fórmulas barrocas usadas por Besse —a comédia na comédia, a ilusão na ilusão— servem perfeitamente para descrever o pensamento de Rousseau. Elas dizem mais do que as figurações românticas posteriores ao tempo do filósofo. E isto não é apenas um problema cronológico. Nos últimos tempos, a pesquisa em história do pensamento político e filosófico procura sair da ilusão retroativa que jogou sobre pensadores das Luzes e do século 17 as teses do romantismo do século 19 e da Contra-revolução. (1)

Além das teses que empurraram Rousseau, Diderot e outros para a epistême organicista do romantismo, o desvinculamento entre aqueles pensadores e o barroco apaga o elemento que, no meu entender, é vital neles, a crítica do poder político enquanto aparência. Claro, esta via tem nos Diálogos platônicos e nas teorizações antigas e medievais o seu lugar elevado. O nexo imediato do século 18 com a Renascença e com a idade clássica ajuda, entretanto, a compreender as críticas simultâneas às artes e ao mando, quando este é tirânico. O romantismo seqüestrou a política e a críticas às artes, arrancando-as do pensamento racional do século 18. E isto gerou a legenda do Rousseau sentimental e isolado do mundo, protótipo do poeta maldito, uma das banalidades do figurativismo romântico.

Logo após enunciar que a crítica de Rousseau às aparências e às mentiras das máscaras é um complexo noético, Besse exemplifica o que diz numa passagem do Discurso sobre a Economia Política: “a lei da qual se abusa, serve ao poderoso ao mesmo tempo como arma ofensiva e de escudo contra o fraco, o pretexto do bem público é sempre o mais perigoso flagelo do povo”. (Besse, 1974, p. 75 )

Rousseau foi retratado como sonhador individualista em cujos textos autobiográficos os gênios românticos encontraram o caminho para a fuga do mundo. Ao mesmo tempo, ele recebeu a pecha de totalitário que exigiu o sacrifício dos átomos sociais ao grande Todo, o coletivo estatal. Os dois ataques são devidos à mesma operação cirúrgica, realizada sine ira et studio por teóricos da contra-revolução romântica. Levantar esta suspeita é o sentido de minha alocução nesta noite.

Comecemos com uma frase verdadeira segundo Rousseau. “é bom que um apenas pereça por todos”. O enunciado vem do Evangelho de João (11, 47- 50). Os mais importantes dirigentes do quase morto Estado judeu, diante do Cristo, se aconselhavam sobre o que deveria ser feito para evitar o entusiasmo do povo pelo Nazareno, visto cada vez mais como rei e prevenir rebeliões seguidas por represálias dos romanos. Cito o trecho bíblico: “Então os principais sacerdotes e os fariseus convocaram o Sinédrio; e disseram: que estamos fazendo, uma vez que este homem opera muitos sinais (semeia, na versão grega)? Se o deixarmos assim todos crerão nele; depois virão os romanos e tomarão não só o nosso lugar, mas a própria nação. Caifás, porém, um dentre eles, sumo sacerdote naquele ano, advertiu-os dizendo: Vós nada sabeis nem considerais que vos convém que morra um só homem pelo povo, e que não venha a perecer toda a nação”. (2)

A lógica dos sacerdotes era a da auto-conservação do povo, e ela fazia sentido pleno, se considerada a ameaça do jugo imperial. A frase da quase razão de Estado encontra sua fórmula consagrada no dito latino: salus populi suprema lex esto (que a conservação do povo seja a lei soberana). Assim, as injustiças mais gritantes, as piores mentiras, podem ser absorvidas no contexto da suposta preservação popular. Este axioma foi assumido, entre muitos, por Gabriel Naudé, em obra clássica e por isto mesmo ainda atual, as Considerações políticas sobre os golpes de Estado.(Cf. Senellart, 1989, p. 115ss ) No mundo de hoje, os líderes dos Estados abusam do sacrifício em nome da salvação nacional. Assim, apenas para exemplificar, após os atentados do 11 de setembro, os EUA retomaram a prática de invadir países, jogando seus cidadãos em campos da morte com a tradicional desculpa dos fariseus que decidiram a sorte do Cristo. Mudou apenas o número. Não se trata mais de sacrificar um apenas. Muitos e muitos devem ser mortos em nome do Estado.

Stalin contou a André Malraux uma sua conversa com Lenine, cujo tema era saber se bastariam 6 milhões de mortes para garantir o novo regime. Ele pendia para 60 milhões. Estava certo. (Dispot, 1978, p. 76, n. 4 ) O século 20 assistiu bestializado 180 milhões de puros assassinatos em guerras e repressões políticas, ideológicas, religiosas. (White, 1998) [3] A razão estatal mostrou a sua irracionalidade em duas guerras mundiais; no uso da Bomba atômica; nos campos de concentração onde milhões de judeus foram sacrificados aos numes do racismo e da intolerância. Massacres ocorreram nas terras armênias, nas ruas de Guernica, nos vales do Camboja, nos estádios de Pinochet, na praça da Paz Celestial, nos desertos africanos, nas estradas do Mississipi. O mundo cobriu-se com os lamentos de mães que entregaram, sem escolha, seus filhos aos deuses do pavor. E tudo ocorreu depois de inúmeras tentativas, feitas por mentes lúcidas e corajosas, para atenuar o ethos guerreiro e intolerante que domina a Humanidade. A Liga das Nações e a ONU prenunciaram o possível advento das luzes e da paz. O mundo, entretanto, ainda deseja as trevas.

Após as Revoluções francesa e norte-americana, a idéia da razão como guia do saber científico e moral perdeu seu encanto. O romantismo conservador tentou, por todos os meios, desacreditar o ideal da paz e da racionalidade. Ninguém melhor do que Novalis expressou a mentira romântica sobre a guerra. Como todos os piores venenos, o ideal bélico foi por ele apresentado sob a forma da beleza: “Na guerra agitam-se as águas originais. É preciso que novas partes do mundo nasçam, que novas raças se cristalizem, surgidas desta desagregação. A guerra verdadeira é a religiosa; ela vai diretamente ao Abismo e nela a loucura do homem mostra-se em toda a sua plenitude. Quantas guerras, em particular as que nascem de ódios nacionais, pertencem a esta classe e são verdadeiro poemas!”. (1953, p. 246 ) Como diz um comentador do fenômeno guerreiro: “O romantismo ocupa o lugar do romanesco de uma guerra idealizada”. (Bertaud, 1992, p. 73ss) [4]

A cultura romântica conservadora ajudou poderosamente a restabelecer o clima sacral, os vínculos entre crenças e Estado, aumentando a carga da intolerância no mesmo passo em que caluniou os pensadores do século 18. No mesmo movimento em que sapou as Luzes, o romantismo selecionou um lado em Rousseau —os tateios na interioridade— e baniu o que, seguindo a razão, investigou criticamente o mundo político e moral.

Voltemos à frase do início. Rousseau, como indica Michel Senellart, não rejeita nem a fórmula “é bom que um pereça por todos” nem o dito salus populi suprema lex esto. Ele distingue dois sentidos nas frases. “Na boca de um cidadão que oferece voluntariamente sua vida pela salvação de seu país, ela é admirável. Significando, no entanto, que é permitido a um governo ‘sacrificar um inocente pela salvação dos muitos’, ela é detestável. Patriótica no primeiro caso, despótica no segundo. O amor da pátria faz uma virtude do sacrifício individual, que o Estado não poderia exigir em nome do bem público”. ( 1989, p. 102-103)

A polissemia é velha companheira dos filósofos, desde o início do gênero literário inaugurado por Platão. No campo da verdade, sobretudo quando ela se une à política, à religião, ao plano jurídico, a prudência filosófica sempre recomendou cautela. Não apenas os pensadores céticos ajudaram muito na prevenção dos perigos produzidos pelos desejos de verdade. Mesmo os que se dedicaram à defesa dos poderes civis ou eclesiásticos, se não foram apenas justificadores vulgares do mando, enfrentaram a polissemia aninhada nas mais corriqueiras das frases. No caso do sacrifício de Cristo, decidido pelos sacerdotes, sublinhei no texto evangélico que os donos do Estado judeu afirmaram que Jesus tinha enorme poder com os sinais, os semeia. Como ler os sinais? Na tradição profética, descrita com lucidez quase insuportável por Spinoza no Tratado Teológico-Político, existiam regras bem estabelecidas, mas todas supunham o conúbio entre os exegetas e a imaginação religiosa. A “verdade” de um enunciado profético encontrava-se no conjunto de sinais da tradição nacional. Para romper o círculo estabelecido na tradição e no imaginário religioso, pensa Spinoza, é preciso dele sair e começar uma outra interpretação, agora com base no intelecto. E o intelecto não opera com sinais, mas com pensamentos. A poesia da Bíblia deve ser esquecida, para que se leia a verdade dos fatos narrados por ela. (5)

Outro pilar do pensamento político ocidental, Jean de Salisbury, no Policraticus —obra que inaugura de modo decisivo a moderna doutrina do tiranicídio— também ensina a prudência na interpretação dos sinais. Existem, diz ele, signos “que nada mostram aos sentidos corporais, mas freqüentemente inculcam na alma o verdadeiro e o falso, mediante a essência de qualquer coisa, ou sem a dificuldade do meio”. Signos podem ser verdadeiros ou falsos. Isto faz com que Salisbury passe dos sinais para as dificuldades semânticas: “se uma palavra possui três ou quatro significados, chama-se polivalente … uma coisa possui tantos significados quantas semelhanças tiver com outras; mas de tal modo que o maior nunca seja o signo do menor, uma vez que os signos sempre são menores”. Quando nem a consciência nem os sentidos fornecem certezas incontestáveis, precisamos aplicar a dúvida. Salisbury, seguidor do platonismo cético da Nova Academia, propõe naqueles casos a suspensão do juízo. (6)

Enunciados polissêmicos não podem ser reduzidos à univocidade. Esta última é uma torsão cujas conseqüências trazem muitas tragédias, sobretudo no campo da política e da ética. As desastrosas cartilhas ou manuais, dicionários de filosofia publicados na Alemanha e na Itália fascistas ou na Academia de Moscou durante o estalinismo, são provas deste ponto. Dei o exemplo da frase sobre a salvação do povo e sobre a morte de um só, para recordar que no interior dos textos de Rousseau as camadas de significação conduzem o pensamento para realidades distintas ou mesmo contraditórias. Muitos dos seus paradoxos entram neste campo.
A seleção, no interior corpus dos escritos roussoístas, de escritos e sentidos, deu-nos algumas versões mentirosas sobre o pensador. E isto não foi obra do acaso. Com o golpe do Termidor, a Revolução Francesa deixou o campo dos valores e passou ao plano mentirosamente mais sólido do interesse econômico e social como base da política. As representações intelectuais do século 18, incluindo as de Rousseau, as de Diderot e mesmo as de um aristocrata como Voltaire, insistiam na virtude cidadã como base do governo não tirânico. Esta doutrina foi reforçada no período jacobino, sobretudo sob Robespierre. Com o golpe do Termidor, ela foi afastada na teoria e na prática políticas.

Comenta Alain Badiou num texto luminoso: “o ponto central é que ao princípio da Virtude se substituiu o princípio do interesse. O termidoriano exemplar (…) é certamente Boissy d’Anglas. Seu grande texto canônico é o discurso do 5 Messidor ano 3. Citemos: ‘Devemos ser governados pelos melhores (…) ora, com poucas exceções, só encontrareis semelhantes homens entre os que, tendo uma propriedade, são apegados ao país que a contém, às leis que a protegem, à tranqüilidade que a conserva’.”. A virtude, comenta Badiou, “é uma prescrição subjetiva incondicionada, que não remete para qualquer determinação objetiva. É por este motivo que Boissy d’Anglas a recusa. Não se exigirá do dirigente que ele seja um político virtuoso, mas que ele seja um representante governamental dos ‘melhores’. Estes não constituem uma determinação subjetiva. É uma categoria definível condicionada absolutamente pela propriedade. As três razões evocadas por Boissy d’Anglas para entregar o Estado aos ‘melhores’ são essenciais e tiveram grande futuro: —para um termidoriano, o país não é, como para o patriota jacobino, o lugar possível das virtudes republicanas. Ele é o que contém uma propriedade. O país é uma objetividade econômica. —Para um termidoriano, a lei não é como para o jacobino, a máxima derivada do nexo entre princípios e situação. Ela é o que protege, e singularmente o que protege a propriedade. Assim, sua universalidade é totalmente secundária. Conta a função. —Para um termidoriano, a insurreição não poderia ser, como o é para o jacobino quando a universalidade dos princípios é pisoteada, o mais sagrado dos deveres. Pois a reivindicação principal e legítima do proprietário é a tranqüilidade. Encontramos, assim, o tripé fundamental de uma concepção objetiva do país, de uma concepção conservadora da lei, e de uma concepção securitária das situações. Uma primeira descrição do conceito de termidoriano nele vê a nuvem do objetivismo, do status quo ‘natural’e da seguridade”. ( 1995, p. 56-57)

Justamente porque o princípio objetivo impera a partir do Termidor e as noções de justiça, valor, virtude, são esvaziadas ao máximo, dando-se preferência à propriedade; porque não é mais permitido mudar a política sem a licença do mercado, o poder passa a desempenhar o papel de protetor da propriedade —velha tese de Locke—(cf.Franco, 1993 ) contra os que não podem se encontrar no rol dos “melhores”. Não é preciso consultar os autores liberais do período, ou mesmo o que sobrou dos que defendiam o jacobinismo, para perceber que a garantia da propriedade deu-se com a mais dura violência. Termidoriano foi o império e termidoriana a restauração monárquica. Em ambos os períodos, o elemento “objetivo” invadiu a política e a cultura, deixando para os indivíduos apenas os devaneios românticos e a sensibilidade exacerbada.

Naquele período, o peso da força policial e da censura, unido à vigilância da Igreja, afastou qualquer veleidade de vida pública, cidadã. Este clima foi magnificamente colhido por Stendhal em Le rouge et le noir. Erich Auerbach analisa o romance e o momento histórico em que ele se inscreve, a partir do tédio experimentado por Julien Sorel nos salões e na vida social mais ampla. O enfado exposto no texto, diz Auerbach, “não é um enfado comum; não provém da casual estupidez pessoal dos seres humanos (…) há entre eles também alguns altamente instruídos, espirituosos, até importantes (…) trata-se com este enfado, muito mais de um fenômeno político e sócio-histórico da época da restauração. No século 17 ou até no século 18, os salões correspondentes eram tudo menos aborrecidos. Mas o ensaio empreendido pelo governo bourbônico, com meios insuficientes, para reimplantar condições definitivamente superadas e condenadas fazia tempo pelos acontecimentos, cria nos círculos oficiais e dirigentes dos seus adeptos uma atmosfera de simples convenção, de falta de liberdade e de afetação, contra a qual o espírito e a boa vontade das pessoas implicadas eram impotentes. Nestes salões não se deve falar daquilo que interessa a todo mundo, dos problemas políticos e religiosos e, conseqüentemente, também não da maioria dos temas literários da época ou do passado imediato; quando muito, podem ser ditas frases oficiais, que são tão mentirosas, que um homem de gosto e de tato prefere evitá-las. Que diferença com a ousadia espiritual dos famosos salões do século 18, que, evidentemente, nem sonhavam com os perigos que desencadeavam contra a sua própria existência!”.

Enquanto o mundo boceja e a polícia garante a propriedade, Julien, lembra Auerbach, “de natureza apaixonada e fantasiosa, sempre se entusiasmou desde a sua primeira juventude, pelas grandes idéias da Revolução e de Rousseau, pelos grandes acontecimentos da época napoleônica”. Temos o núcleo da tragédia, em Le rouge et le noir: a existência e as idéias de Sorel chocam-se com o mundo que recusou a Revolução. Seus padrões morais o tornam revoltado com a perda dos valores na Restauração. Nela, quem não se curva aos “fatos”, se estilhaça ou morre. “Os heróis dos romances pré-românticos delatam uma aversão por vezes quase mórbida a entrar em contato com a vida contemporânea. Já para Rousseau a contradição entre o natural, que desejava, e o real historicamente fundamentado, com que se deparava, tornara-se trágica; mas esta contradição incitara-o para a luta pelo natural. Não mais vivia quando a Revolução e Napoleão criaram uma situação totalmente nova, mas não uma situação natural no sentido de Rousseau, mas ainda uma situação ligada historicamente. A geração seguinte, profundamente impressionada com os seus pensamentos e com as suas esperanças, viveu a resistência vitoriosa do histórico-real, e precisamente aqueles que mais profundamente sentiram a sua influência encontram-se num mundo novo, que destruíra totalmente as suas esperanças, e no qual não puderam se sentir à vontade. Entraram em oposição com ele ou afastaram-se dele. Da herança de Rousseau guardaram somente a cisão interna, a tendência para a fuga da sociedade, a necessidade de se isolar e de ficar sozinho; o outro lado da natureza de Rousseau, o lado revolucionário e combatente, este eles perderam”. ( Auerbach, 1971, p. 395ss)

Alain Badiou indica a torsão operada a partir do Termidor, a qual vai dos valores ao mercado. Auerbach expõe, na figura de Sorel, a mesma torsão, agora no plano “espiritual” mais amplo. O mundo dos fatos brutos e da “realidade histórica” impõe-se como fatalidade sobre os românticos que escrevem e sobrevivem na sociedade civil. Eles abandonam as teses políticas e morais de Rousseau (eu diria, do século 18) em prol da segurança objetiva do Estado e da sociedade. Os sonhos de um mundo melhor são banidos em favor das experiências pessoais, dos sentimentos subjetivos, dos delírios imaginários. O que é “objetivo” encontra-se definido pelo mercado e pela polícia. O subjetivo é liberdade que sonha, no mundo da interioridade absoluta. Temos a gênese do filistinismo intelectual, denunciado em escritores como Hegel, Marx, Stendhal, Flaubert. Muitos filósofos e artistas recusaram lutar politicamente contra a “realidade” para manter o seu ego sensível, supostamente mais profundo do que a razão. Hegel definiu com perfeito cinismo esta atitude. Trata-se, para ele, “do absoluto en négligé”, o universo dos artista sem obra de arte. Contra a perigosa onda revolucionária, os românticos preferem a revolta, Empörung na língua alemã.

É nesse exato instante que os escritos de Rousseau e de seus companheiros e adversários do século 18 são divididos, não arbitrariamente, mas segundo as conveniências políticas, ideais, religiosas da Restauração, em textos políticos de um lado e auto-biográficos de outro. Os primeiros seriam perigosos, mentirosos, sem importância na sua loucura. Os segundos seriam sublimes e belos, adequados aos padrões românticos. Um dos principais produtores deste corte que desfigurou por longo tempo os escritos de Rousseau é Sainte-Beuve, dos mais refinados críticos literários, expoente do romantismo conservador.


Sainte-Beuve, que produziu um monumento até hoje relevante para quem deseja entender o pensamento francês do século 17, o famoso Port- Royal, no seu trabalho sobre o século 18 fez a operação cirúrgica que desarmou a força crítica do pensamento de Diderot, de Voltaire e de Rousseau. Não falarei das “transfigurações” efetuadas por ele nos textos diderotianos nem nos de Voltaire. Basta indicar o que ele fez com Rousseau.

O político e o moral não têm grande importância em Rousseau, proclama Sainte-Beuve. O relevante mesmo teria sido o papel do pensador no refinamento da língua e do estilo franceses. Ele enxerga em Jean-Jacques “o escritor que fez experimentar (na língua…) uma revolução da qual nós mesmos, do século 19, datamos”. (Sainte-Beuve, 2001 ) Da política à língua… Evidentemente, os dois lados são complementares. Nenhum filósofo ou mesmo retor forja recursos formais em função apenas de seu brilho. Sainte-Beuve diz explicitamente que Rousseau produziu um estilo brilhante e com ele supera os textos políticos. Apenas nos volumes autobiográficos ele une com perfeição e verdade forma e conteúdo. Nos demais casos, o conteúdo perigosamente revolucionário faz lembrar, adianta Sainte-Beuve, “uma lógica misturada de chamas, idéias confusas que se agitavam e queriam nascer”. Trata-se de exaltar na escrita autobiográfica, diz Roger Fayolle, junto ao “público cultivado” (o mesmo que se entediava nos salões onde a censura era rainha) “a imagem anódina e apresentável de um Rousseau ‘pré-romântico’ que substituirá a do Rousseau real, cuja ambição maior não era, com certeza, dobrar a língua aos novos usos”. (Fayolle, 1972, p. 228 )

Uma vez que só importa em Rousseau o estilo e a língua, pouco serve estudar aqueles elementos no Emilio e no Contrato Social. Eles devem ser buscados nas Confissões, nos Devaneios do caminhante solitário, etc. Sainte-Beuve deixa escapar, de vez em quando, algumas razões da sua escolha. “O momento atual não é muito favorável a Rousseau, a quem se imputa ter sido o autor, o promotor de muitos males por nós sofridos”. Pode-se dizer “judiciosamente”, acrescenta ele citando Joubert, “que não existe escritor mais apto a tornar o pobre soberbo”. ( 2001, p. 80)

Assim, é possível fugir dos temas “perigosos” e proibidos pela censura da Restauração e separar a política e Rousseau, o autor que mais liberou os mesmos assuntos perigosos no éter cultural francês desde o século 18. Trata-se para Sainte-Beuve “de tornar Rousseau responsável menos pelos horrores da Revolução do que pelas audácias estilísticas dos escritores românticos”. (Fayolle, 1972, p. 229 ) Extirpada a originalidade do pensamento sobre a política do campo dominado por Rousseau —importa dizer que esta operação cirúrgica ainda era feita no século 20 contra autores do 18, como acentua Franco Venturi em sua crítica às análises de Ernst Cassirer — (8) resta apenas a via do subjetivo, da expansão cordial, dos suspiros lânguidos e da fuga do mundo, temas banais do romantismo. Para Sainte-Beuve “Rousseau se engana, não ao acreditar que sua empresa é única, mas ao pretender que ela é útil: de fato, ele agiu como um médico que descreveria uma doença mental e imitaria os loucos”. (2001, p. 82 ) E o crítico indica também o aspecto central de Rousseau para o romantismo: “a exaltação desmedida do Ego e das suas paixões, indiscretamente propostas como exemplo” (Fayolle). Deixando-se de lado o pensador político, tem-se oportunidade de perceber em Rousseau “o primeiro que colocou o verde em nossa literatura”. Ao comentar o célebre trecho das Confissões, o quadro sobre Rousseau criança e papai lendo madrugada adentro —“às vezes meu pai, ouvindo pela manhã as andorinhas….”— Sainte Beuve exclama embevecido : “notem bem esta andorinha, é a primeira e anuncia uma nova primavera da língua…”. (p.82) Além deste lado ingênuo, pueril mesmo, Rousseau ensinou, segundo Sainte-Beuve, ao século 19 o mal do devaneio. Assim, temos o esboço do escritor paradigmático do romantismo, em Sainte-Beuve e nos que o seguiram: “um Rousseau meloso, terno, enternecedor, sentimental e sonhador, “que revelou sua natureza e colocou à luz as dobras do seu coração”. Quem analisa o Contrato, a Profissão de fé, as obras morais do filósofo, percebe o estupro adocicado cometido contra os textos. No entanto, boa parte da recepção dada aos seus escritos entrou nesta categoria dos róseos bombons estilísticos, graças à alquimia conservadora e romântica.

A cesura feita por Sainte-Beuve, bem adequada ao período que resultou do Termidor, marcou as preferências de boa parte dos comentadores e ajudou a deformar o retrato de Rousseau e dos outros pensadores do século 18. Como reação a semelhante desfiguramento romântico, ou talvez como continuidade do mesmo desfiguramento (visto que o romantismo conservador foi profundamente autoritário) tivemos no século 20 interpretações denunciando um Rousseau comunitarista e mesmo totalitário. É quase um monotema, nas propostas de interpretação de Rousseau totalitário, encontrar a fonte desta atitude no próprio ego do pensador. Nos desarranjos e fraquezas de sua inteligência e alma, brota o totalitarismo.

Frederick Watkins repete a lição que vem desde Vaughan: “Rousseau era um tipo inteiramente diferente de pessoa, as fraquezas e força de seu pensamento são distintas das apresentadas pelos outros teóricos políticos. Embora dotado por natureza com poucos dons de lucidez analítica, ele percebeu as motivações políticas e sociais dos homens com incomum intuição perceptiva. Devido às contradições internas de sua personalidade, ele julgou necessário dar espaço na teoria política para complexidades psicológicas desconhecidas pelas construções sistemáticas de pensadores mais estritamente lógicos. Dado que ele mesmo foi incapaz de reduzir seu pensamento a um todo lógico consistente, é fútil impor-lhe um sistema e seguir cada uma das suas várias intuições, levando-as às suas conclusões lógicas. (…) Toda interpretação útil de seus escritos deve começar, pois, com uma compreensão dos fatores psicológicos que lhe possibilitam ter uma visão compreensiva dos problemas políticos”.

Logo, o problemático Rousseau em termos psicológicos, não possui força lógica para estabelecer um sistema coerente. Seu interior sensível, melhor entendido nas obras autobiográficas, ajusta-se melhor às batidas cordiais e suas intuições não podem ser pensadas de modo racional. A suposta incoerência dos textos leva à atribuição de atitudes opostas em Rousseau: de um lado, o liberalismo e, de outro, o totalitarismo. “Para ele, como para a maioria dos totalitários, um extremo pessimismo era a base para a recusa dos princípios constitucionais. Enquanto o liberal consistente deve acreditar não apenas que o povo comum deve assumir responsabilidades pelo seu próprio destino político, mas também ele deve ser capaz, na base de sua própria razão e experiência, para manter a ordem social”.

Rousseau, calvinista, não acreditava na segunda linha de exigência. Mesmo em circunstâncias favoráveis, o povo simples não pode, por si mesmo, ser capaz de controle de sua vida política. “O aspecto totalitário de seu pensamento deriva desta convicção (…) Ele insiste em dizer que o legislador, embora justificadamente use mentiras e outras formas de engodo para atingir as pessoas com seus propósitos, deveria persuadir em vez de forçar o povo comum a aceitar os seus ditames. Liderança iluminista em vez do despotismo esclarecido era a solução de Rousseau para o problema de transcender as limitações intelectuais e morais do homem comum”. ( Watkins, 1953)

Se o Rousseau totalitário não recomenda a força física ou os meios definidos pela retórica da razão de Estado para constranger o povo comum, ele utiliza o estilo melífluo. Os laços cordiais são acentuados nos seus escritos, jogando-se o sentimento dos textos autobiográficos sobre os políticos. Todo o arcabouço racional dos seus escritos é exorcizado em prol de um delirante irracionalismo autoritário, bem de acordo com o próprio romantismo conservador.

Pode-se dizer que Sainte-Beuve e seus herdeiros exorcizam no Rousseau político um fantasma, o da Revolução francesa que assombrou os reacionários europeus (9) desde o início do século 19. Como diz o próprio Sainte-Beuve, a propósito de Voltaire: “ele tinha contra ele, no fundo, mesmo no partido da filosofia então triunfante, os discípulos e seguidores desse Rousseau que ele havia conhecido pouco e ultrajado. Após a Revolução ter feito a sua obra ruína, vários antigos adoradores de Voltaire mais do que pela metade; eles separaram-se de seu culto, pois sentiram o preço das instituições que havia imprudentemente sapado”. (Sainte-Beuve, 2001, 20.10.1856 )

Não discuto agora, passo a passo, as marcas do pensamento conservador. Em O Conservadorismo romântico, apresento os elementos mais amplos desta forma de pensar o mundo e a vida espiritual. Digo que se trata mais do fantasma da revolução francesa e menos dos escritos políticos, eles mesmos, de Rousseau, porque existem trabalhos que mostram a grande distância entre o escritor de Genebra e os revolucionários, girondinos, jacobinos e mesmo sans cullotes. Após resenhar a questão com minúcia, Iring Fetscher (1977 ) mostra, nos textos, que poucas demonstrações sólidas existem no item “influência de Rousseau sobre a Revolução Francesa”. O mais apropriado é dizer com Albert Soboul: “poder-se-ia falar menos de uma filiação das idéias de Rousseau do que numa concordância (…) que o ambiente social basta para explicar. O conhecimento direto ou indireto de Rousseau indiscutivelmente favoreceu a consciência e permitiu precisar aquele formulação”. (Fetscher, p. 264)

O recorte operado nos livros de Rousseau por Sainte-Beuve e pelos românticos, joga as obras do genebrino no domínio das entidades monstruosas, cuja forma se divide em dois e cujos conteúdos são alheios uns aos outros. Fosse ele um Realpolitiker, sua teorização receberia as cores da razão de Estado. E aí, o indivíduo deve morrer, como no totalitarismo, em função da potência política, do Leviatã que encarna a pessoa coletiva, o mentiroso “todos”. Fosse ele liberal, e não aceitaria sob nenhuma hipótese a tese do sacrifício de um em prol do coletivo. Com a ruptura feita à força entre os textos políticos e os autobiográficos, sobra uma filosofia do “mais ou menos”. Ou seja, segundo os padrões rigorosos do pensamento filosofante, uma não-filosofia. Chegamos ao resultado desejado por todos os românticos conservadores em relação ao pensamento das Luzes em geral, e de Rousseau em particular. Basta reler uma pequena seqüência frásica de Joseph de Maistre sobre Rousseau: o escritor se apossou do assunto —a questão da desigualdade mal proposta pela Academia— “porque era um tema que foi expressamente feito para ele. Tudo o que era obscuro, tudo o que não apresentava nenhum sentido determinado, tudo o que se prestava a divagações e aos equívocos pertencia ao seu domínio particular”. (De Maistre, 1995 )

Se a operação romântica fosse correta, no entanto, a frase com a qual iniciei estas considerações, “é bom que um apenas pereça por todos”, seria lida com sentido e sinal únicos. O acentuado nela é o sacrifício do indivíduo pelo Todo. Este é o programa integral do romantismo conservador. Nele, a idéia orgânica do Estado teve como reverso a exigência do relacionamento pessoal, todo subjetivo, entre governantes e governados. A política foi entendida como ato amoroso do primeiro em relação aos segundos e vice-versa. Esmaeceram-se os traços violentos da política: o “amor” do governante pelos súditos tem por princípio o controle efetivo pelo Príncipe. Este deveria fazer, “no Estado poético”, com que todos os particulares se alegrassem no “desejo de limitar suas pretensões e sacrificar-se pelo amor deste grande indivíduo” que é a comunidade estatal.

A “bela comunhão” que arranca o sacrifício dos indivíduos é um pedaço de doutrina que tem algum fundamento em Rousseau. Não é permitido esquecer, por exemplo, no Contrato Social, os enunciados sobre a pena de morte e o problema da conservação individual. Citemos: “O tratado social tem por fim a conservação dos contratantes. Quem deseja o fim também quer os meios e estes meios são inseparáveis de alguns riscos, mesmo de algumas perdas. Quem deseja conservar sua vida às custas dos outros deve dá-la também para eles quando é preciso. Ora, o cidadão não é mais o juiz do perigo ao qual a lei quer que ele se exponha; e quando o Príncipe lhe disse: ‘É preciso ao Estado que tu morras’, ele deve morrer; pois é apenas com esta condição que ele viveu em segurança até ali, e que sua vida não é mais um benefício da natureza, mas um dom condicional do Estado”. (Rousseau, 1943, p. 161-162 )

Em primeiro lugar, é preciso dizer que o trecho insere-se no campo da lei e da defesa comum diante das ameaças ao corpo social. Evidentemente, trechos como este podem, e o foram, torcidos rumo às ações despóticas de governos, inclusive de governos que se denominaram democráticos. Mas no autor que aprofundou como poucos o direito natural e defendeu a individualidade, ao ponto de ser duramente criticado na apologética hegeliana do Estado, aquele fragmento mente sobre Rousseau. Se é verdade que todos os filósofos são a súmula de seus textos, de seu tempo e de seus intérpretes, é preciso, no estudo de Rousseau, cautela para não tomar como se fosse dele uma complexa invenção tardia, seja ela romântica, liberal, marxista, ecologista, psicanalítica. Caso exista sentido na leitura filosófica, ele encontra-se na busca de compreender significados e sinais. Mas estes podem ser substituídos pelos hermeneutas e logo transformados em palimpsestos cujas camadas guardam e revelam mais as leituras posteriores do que os significados originários.

Brotou do solo romântico o fantasma de um Rousseau sacerdote do culto de sua própria sensibilidade. Esta figura, formando um monstro literário e filosófico, uniu-se ao Rousseau jacobino, “tarântula moral” e pai de Robespierre, o responsável pelo “fanatismo francês do coração” como afirma Nietzsche( 1971, p. 6), — ainda no cenário aberto pela interpretação romântica. O esfacelamento dos escritos em “políticos” e “sentimentais” levou Nietzsche às bases da cortante divisão sobre o filósofo, indicando o fundamento não questionado pelos românticos, a separação entre o interior e o exterior do homem. “Se é verdade que a nossa civilização tem em si mesma algo miserável, podemos escolher juntar-nos a Rousseau com a conclusão ulterior que ‘da nossa perversa moralidade tem culpa a miserável civilização’, ou, contra Rousseau, retornar à conclusão que ‘da nossa miserável civilização tem culpa a nossa boa moralidade’. Os nossos conceitos fracos, desvirilizados, sociais conceitos de bem e de mal, e o monstruoso suprapoder deles sobre as almas e os corpos e para constranger os homens autônomos, independentes, sem preconceitos, as colunas de uma robusta civilização: donde ainda hoje se encontra a perversa moralidade, se enxergam as últimas ruínas desta coluna. ‘Assim se oponha paradoxo contra paradoxo! Impossível que a verdade possa ser de ambas as duas partes; e ela é de uma destas partes? Pode-se examinar”. (p.146 )

Um caminho menos perigoso, na interpretação do pensador, encontra-se em Henri Gouhier. No escrito denominado “Filosofia de Rousseau e filosofia de Jean-Jacques”, lemos que “a diversidade dos gêneros literários utilizados por Rousseau multiplica as mediações: as obras que ele dá ao impressor, seus escritos autobiográficos e as peças mais importantes de sua correspondência poderiam constituir uma cadeia mais ou menos contínua, se elas fossem colocadas na mesma linha segundo dos dois modelos, o dos Devaneios e os da Profissão de Fé. Assim, aplicada ao pensamento de Rousseau, a palavra ‘filosofia’ recobre ora uma filosofia exposta por ela mesma, ora uma filosofia imanente a escritos não filosóficos. Esta ambigüidade põe a questão: trata-se da mesma filosofia aqui e ali?”.(1984, p. 86-87 ) A forma interrogativa mostra um avanço que leva a pesquisa para longe das mentirosas divisões românticas. Ainda estamos longe de superar o romantismo, em seus múltiplos avatares, na cultura ocidental. Esforços como este, mal sucedidos, trazem, no entanto, alguma luz sobre os pensadores da Renascença e do século 18, tão caluniados no romantismo que marcou os séculos 19 e 20. Por semelhante motivo, reuniões como a que hoje se inicia são estratégicas no mundo acadêmico e político. Nelas, não se propõe um estudo monotemático ou monocrômico de Rousseau, mas a busca —a partir dos estilhaços interpretativos— de algum sentido verdadeiro para o discurso do filósofo e dos seus pares iluministas. Desejo a todos um excelente trabalho!

Notas

(1) Trabalho recente e útil, neste sentido, foi apresentado por Saverio Sansaldi: Spinoza et le Barroque. Infini, Désir, Multitude. Paris: Kimé, 2001. Em plano muito próximo, discuti o problema no artigo "A razão sonhadora. Descartes e o Barroco", in O Caldeirão de Medéia, São Paulo: Perspectiva, 2001.

(2) Tradução João Ferreira de Almeida, Bíblia Sagrada. Brasilia: Sociedade Bíblica do Brasil, 1969, p. 128. Cf. Novum Testamentum Graece et Latine, Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 1981, p. 547.

[3] O autor agrupa os dados das guerras, das mortes devidas às perseguições políticas, religiosas, ideológicas, etc. Trata-se de uma fonte que não deve ser desconhecida pelos que se interessam pelos problemas da guerra e da paz.

[4] O artigo traz boas achegas ao problema da guerra no pensamento das Luzes, analisando ao mesmo tempo a organização, as técnicas, as figuras humanas do mundo bélico antes e depois de Napoleão.

(5) Cf. Laux, Henri: Imagination et religion chez Spinoza. La potentia dans l ´histoire. Paris: Vrin, 1993. Em artigo que compõe a coletânea O desafio do Islã (São Paulo: Ed. Perspectiva) intitulado "O sol negro da noite", analiso o problema em Spinoza. Para a política spinozana, publiquei recentemente o texto "A igualdade, considerações críticas" no site Foglio Spinoziano. Retomado em meu livro Ponta de Lança, São Paulo: Lazuli Ed., 2006.

(6) Analisei estes pontos no artigo "Lembra-te que és homem", publicado pela Revista Justiça e Democracia, da Associação Juízes para a Democracia, número 1, primeiro semestre de 1996, p. 153ss.

(7) Seguirei neste ponto, integralmente, as análises de Fayolle, 1972, p. 227s.

(8) Por exemplo: "apesar de seu forte interesse por todos os problemas políticos, o período das Luzes não desenvolveu uma nova filosofia política. Quando estudamos as obras dos mais famosos e influentes autores nos surpreendemos ao notar que eles não trazem nenhuma teoria nova. As mesmas idéias são repetidas sempre e sempre —e tais idéias não foram criadas pelo século 18. Rousseau fala em paradoxos, mas quando chega à política, ouvimos um tom diferente e sóbrio. Na concepção de Rousseau do alvo e do método da filosofia política, na sua doutrina dos inalienáveis direitos humanos, dificilmente existe algo que não tenha paralelo e modelo nos livros de Locke, Grotius ou Pufendorf. O mérito de Rousseau e de seus contemporâneos encontra-se (...) na via política mais do que na doutrina" (Cassirer, 1996, p. 176-177).

(9) O termo é este mesmo, apesar dos abusos cometidos contra ele pelos stalinistas e fascistas do século 20. Para uma análise da palavra e do conceito, ver Starobinski, 1999.


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